Ensaio

Por Vitor Vedovato

''Marcel Duchamp talvez tenha sido um dos artistas mais sui-generis das últimas décadas. Sua personalidade é sempre trazida como serena, educada, porém irônica e de uma grande sagacidade intelectual. Questionador quanto ao que envolvia as importâncias científicas e filosóficas da existência e da arte, Duchamp expressou em seus trabalhos tais indagações de forma notável. [...] Portanto, o olhar para Marcel Duchamp pede um prisma no qual essas preocupações são desvanecidas. Não obstante, deve-se considerar que as reverberações de suas ações e inovações foram vastas e atingiram as mais diversas expressões artísticas, inclusive as de preocupações sociais e políticas.''

Por Gabriel Marotti Ricardo

"Atrás do slogan fascista Brasil acima de tudo, Deus acima de todos – utilizado por Bolsonaro –, houve todo um apoio expressivo das igrejas neopentecostais que, em nome de valores morais, cristãos e patrióticos (aos gritos de “Deus, pátria e família”), contribuíram com um processo de militarização do governo federal e suas instituições políticas. Neste artigo buscarei identificar aspectos da subjetividade militar e armamentista no contexto da cultura gospel, isto é, não necessariamente partindo da principal fonte das mensagens cristãs, a bíblia, mas demonstrando como a música gospel atua como importante meio de difusão de subjetividades que orientam as massas evangélicas em direção a estetização da guerra."

Por Quésia Olanda

"É com a poesia musicada por Estrela Leminski que dou início a essa jornada. Jornada marcada por muitos afetos, os quais tentarei transmitir. Razão e sentidos são questões recorrentes na história da filosofia, uma discussão legítima e intrigante, que expandiu a rota que estava traçando – não em busca de uma resposta concreta, mas de reflexão e contribuições. Para me auxiliar na estrada, coloquei no tocador de música a canção citada, e durante a escuta fui levada a muitas perguntas e dúvidas, transformando-as nesta escritura."

Por Henry Burnett

"Li entre arrebatado e ligeiramente incomodado o conjunto de textos publicados na revista Piauí ao longo de vários meses, antes de ver alguns daqueles vídeos que ele próprio captou desde a primeira manhã de sua estadia em Belém, da janela do apartamento onde se hospedou. Relidos agora em versão revista na edição em livro, Arrabalde: em busca da Amazônia [Companhia das Letras, 2022] me causou menos incômodo; ainda assim, tentarei sintetizar aqui aquela dupla sensação inicial."

Por Alexandre Squara

"A cidade de Manoel de Barros, ao contrário do que as primeiras impressões podem indicar, é futurista. O poeta mato-grossense forjou em sua obra desenhos de vertigem, que se disfarçam de poucas linhas para revelar – à medida que se adentra seu espaço – a complexidade característica de quem se lança em busca do Nada. Mas, por enquanto, iremos apenas à um bairro desta cidade, O Livro sobre Nada, de 1996, é uma das mais densas incursões nos vacilantes solos do Nada."

Por Danilo Mendes de Oliveira

"Então o que se pode esperar da arte talvez seja o encontro de referências que remontem à tradição da própria arte. O incômodo de se pensar que as necessidades do mercado estejam ditando a forma como o cinema seja produzido, talvez se dê pelo fato de que os signos do próprio cinema estejam sendo modificados ou até mesmo esquecidos. No entanto, como se pode ver através do filme Cruzada, ainda se enxerga elementos que remontam a uma tradição dentro dos filmes épicos de guerra, mesmo quando se fala em uma superprodução."

Por Gabriel Dib Daud De Vuono

"En 2021 celebramos el centenario del nacimiento del pensador y maestro brasileño Paulo Freire que nos hace recordar su trayectoria y aportes a la construcción de un proyecto transformador de sociedad de base popular. En esta ocasión es oportuno discutir las ideas de Paulo Freire sobre la formación de una educación crítica y liberadora". 

Por Francisco Fontanesi Gomes

"Giueseppe Arcimboldo (1527 – 1593) talvez seja um dos meus artistas italianos preferidos de todos os tempos [...] Arcimboldo é uma estrela que se destaca completamente fora de sua constelação. Seu brilho, que parece tão estranho e inconstante, quando observado de perto chega a nos cegar por um breve momento de tão assustadora a sua capacidade criativa. Não apenas nos agrada, nos incomoda."

Por Francisco Fontanesi Gomes

"Com sua simplicidade quase elegante e quantidades exorbitantes de nicotina, sua História com a intelectualidade é algo que também se compra, caro leitor, quando se compra um maço. Sua simbologia é tão importante quanto o produto em si. [...] Bom, meu ponto está exatamente nisso, caro leitor. Tentar refletir um pouco sobre essa origem da carga simbólica do cigarro e, em especial, a carga simbólica do cigarro transmitido pela pintura. E não há, caro leitor, um artista em que o tabaco esteja em mais evidência do que no norueguês Edvard Munch (1863-1944)."

Por Alexandre Squara

"Se 2020 tivesse sido um ano normal, um dos nomes que mais teríamos ouvido falar é o de João Cabral de Melo Neto cujo centenário teria se celebrado. É certo que a pandemia não corrompeu a matemática nem o avanço do tempo, o poeta pernambucano encontrou o centésimo ano a partir do nascimento, mas – como tudo que não é vírus, doença e morte foi ofuscado em 2020 [...] Cabral fez cem anos no pior ano da história recente do mundo, e este fato, de alguma forma, pode ser a grande homenagem que o espírito do tempo prestará ao poeta."

Por Sergio Carvalho da Fonseca

"A cena era a seguinte: um garoto adentra ao palco carregando um caixote de engraxate nas costas. Ele caminha entre duas fileiras de sapatos organizados dos mais surrados aos mais novos, representando as classes sociais. O garoto começa gritando “graxa, senhor” com uma animação inicial, entre os sapatos de classes mais baixas, que vai se esvaindo perante a pressão social dos sapatos mais novos, até quase sussurrar o oferecimento de seu trabalho."

Por Francisco Fontanesi Gomes

Olá novamente, caro leitor. Hoje vim lhe trazer um quadro um tanto quanto distante de nossa tradição ocidental, mas que diz tanto sobre a Rússia de ontem e de hoje quanto a visão do que é governar como um autocrata. Muitos tiveram a possibilidade de acompanhar a minissérie produzida pela HBO, Chernobyl, de 2019. [...] Mas agora, caro leitor, você deve estar se perguntando: “Mas por qual motivo estamos falando dessa série? O que ela mostrou que chamou tanto a atenção e o que isso tem a ver com a autocracia na Rússia?”

Por Francisco Fontanesi Gomes

Caro leitor, venho através deste texto lhe apresentar um quadro nomeado Duelo a garrotazos, do artista espanhol Francisco de Goya y Lucientes. [...] Mas a pergunta que deve vir a sua cabeça, [...] é: “Por qual motivo ele pintou algo assim? Uma pintura não era para ser 'bonita', ainda mais neste período em que Goya viveu, das grandes cortes europeias?” – no que lhe respondo, caro leitor, que sim.

Por Sergio Carvalho da Fonseca

Conta-se que uma peça estava sendo encenada em um dos pequenos países do Leste Europeu quando num determinado momento de um monólogo o público, que sofria nas mãos do ditador chefe daquele país, interpretou as falas representadas pelo ator como o momento vivido por eles. [...] O público saiu imediatamente do espetáculo, estabeleceu uma revolução e conseguiu derrubar o governo. É importante esclarecer que a peça não tratava de guerras, revoluções ou governos despóticos. Tudo não passou de uma interpretação coletiva dos fatos irreais e ficcionais, para os reais.

Por Gabriel Herkenhoff Coelho Moura

A luz adentra as cavernas e mostra imagens nas pedras. A mera aparência, quimera. Vemos no fundo perfis da verdadeira experiência da necessidade da caça em uma natureza vivida na nudez de seus ciclos e humores, sem controle. [...] Temos diante de nós a descoberta de uma forma de expressão a perdurar nas paredes que guardam o exercício nascido antes das coisas terem nomes, agora chamado arte rupestre.

Por Lucas Carvalho Lima Teixeira

Muitíssimo se depreende do caráter de pensamento de alguém a partir da maneira como o tal espontaneamente lê aquele fabuloso capricho de Goya, onde se diz em enfática estética lapidária: El sueño de la razon produce monstruos.

Por Sérgio Assunção

Diante da barbárie e do materialismo decorrentes da lógica industrial no ocidente civilizado do século XIX e XX, a lírica moderna possibilitou ao sujeito voltar-se sobre a própria obscuridade e esvaziamento psíquico e existencial, por meio de uma experiência pela qual se inscreveu um saber de indefectível verdade acerca da condição humana.